sábado, 13 de maio de 2017

"Novo Pentecostes" - Gustavo Corção

É a última espetacular novidade religiosa que se espalha com grande sucesso no mundo inteiro. Num recorte recente de "Le Monde" lemos a notícia desse movimento cujo sucesso se contrapõe, na pena de Henri Fesquet, "ao declínio das grandes Igrejas" mais ou menos institucionalizadas. Esse movimento de origem protestante, nascido antes do século, cresceu agora rapidamente. O número de "Assembléias de Deus" que era de 264 em 1963 ultrapassa o número de 400 em 1972. Calcula-se em dez milhões o número de praticantes no mundo inteiro", diz "Le Monde"; e como era de esperar anuncia que o movimento já entusiasmou o mundo católico onde ganha o nome de "renovação carismática" e até reclama o mais ousado título de "novo pentecostes".

Em Junho reuniu-se na Universidade Notre Dame, nos Estados Unidos, um "congresso de renovação carismática" com o comparecimento de 25.000 participantes entre os quais figuravam muitos padres, Bispos, e o Cardeal Suhenens, Primaz da Bélgica.

Que dizem de si mesmos esses católicos empenhados em tal movimento? Várias publicações, entre as quais destaco a do jovem casal americano Kevin e Dorothy Ranaghan, num livro traduzido em francês com o título "Le Retour de l'Esprit", apresentam o movimento pura e simplesmente como uma descontinuidade explosiva surgida na História do Cristianismo e produzida, nem mais nem menos, por uma nova descida do Espírito Santo sobre os milhares de adeptos que recebem, por imposição das mãos de outros, o "batismo do Espírito" e subitamente se convertem, mudam de vida, passam da mais profunda depressão à mais jubilosa exaltação, e começam a "falar em línguas", como os cristãos da Igreja nascente, e como os apóstolos no dia de Pentecostes (At 2, 1)

Uma as características do estado de espírito produzido nas assembléias carismáticas é a predominância da exteriorização sobre a interiorização, e a marcada emotividade que leva os adeptos a sentirem a presença do Espírito Santo, e a declararem essa convicção com uma espontaneidade — cada um contando sua experiência própria — que se liberta de qualquer compromisso de submissão à aprovação da Igreja.

Até aqui o nosso espanto não foi excessivo porque este fim de século e o mundo católico dito "progressista" já nos saturaram de extravagâncias, e já nos embotaram a manifestação do espanto. A nossa preocupação começou a ganhar dimensões de alarme quando vimos que o prudente hebdomadário "L'Homme Nouveau", dirigido por Marcel Clement, enviou 7 representantes ao Congresso de "renovação carismática" na Universidade Notre Dame, e que o próprio Marcel Clement, no seu editorial de 1o. de Julho, não hesita em falar de "novo Pentecostes" e de fazer este estranho pronunciamento:

"É uma realidade de Igreja. Equilibrada, serena, poderosa. Não se trata de misticismo exaltado. É verdadeiramente o Espírito Santo que os invade e os faz caminhar muito depressa até à única e verdadeira Igreja de Jesus Cristo."

A nós nos parece que depressa demais pronunciou-se o Prof. Marcel Clement, como também nos parece incompreensível que se diga "cheminement très vite jusqu'à la seule et veritable Église de Jesus Christ" de pessoas já nela inseridas pelos sacramentos.

Prevemos o caminho de uma luta mais difícil do que as outras que até agora tivemos de enfrentar porque todos terão pressa excessiva de marcar pontos positivos num movimento em que os rapazes e as moças só dizem que querem rezar em "comunidade carismática", porque receberam do próprio Espírito Santo, num novo Pentecostes, dons maravilhosos que os tiraram dos mais profundos abismos e os elevam à mais pura alegria. Quem quererá cobrir-se do negrume de todas as antipatias para enfrentar tão maravilhosa transformação do mundo com um mínimo de reserva ou de exigência?

Para encaminhar adequadamente a questão, amigo leitor, começo por lhe lembrar alguns títulos que nos dão direitos a certas exigências. Somos um povo que há 2 mil anos segue a pista de um Deus flagelado; pertencemos à forte raça daqueles mártires que deram o sangue para testemunhar a verdadeira Religião e para resistir a todas as fraudes; descendemos também daqueles outros que silenciaram nos mosteiros os seus próprios sentimentos e as suas próprias emoções para deixar que só o Espírito de Deus falasse por eles. Pertencemos a um Povo ainda mais antigo que ouviu do próprio Deus o trovão de uma identidade absoluta:

"Eu sou aquele que sou", e o preceito da mais inquebrantável intolerância: "não terás outro deus diante de minha face".

Tudo isto, amigo leitor, nos inclina a uma profunda aversão por tudo que pareça equívoco, e que, em matéria de Religião, mais manifeste as turbulências da pobre alma humana torturada por um mundo encandecido do que as grandezas de Deus manifestas pelos Apóstolos no dia do único e verdadeiro Pentecostes.

Logo a seguir tentarei expor as razões que me levam a ver nesse movimento uma nova feição da "revolução" que quer por vários processos destruir a Igreja.

Aqui trago apenas os títulos que me dão o direito de exprimir tais reservas, e que me lembram o dever de as exprimir. Pecador e inútil servidor, pertenço todavia àquela raça exigente. Sou homem de Igreja que só quer nela viver e nela morrer.

Para comparar o movimento chamado "pentecostismo" com a Igreja de Jesus Cristo, comecemos por comparar a descida do Espírito Santo sobre os Apóstolos, no dia de Pentecostes ao "novo pentecostes" que desce sobre cada um dos 25 mil membros do encontro realizado na Universidade Notre Dame (USA).

Há fenômenos semelhantes, como a "glossolalia" ou língua estranha falada pelos crentes do Cristianismo no primeiro século, pelos Apóstolos no dia de Pentecostes, e hoje pela multidão dos pentecostistas. Mas a semelhança termina quando ponderamos que Pentecostes foi, para a Igreja nascente, não uma explosão de manifestações espontâneas e multiplicadas, mas, ao contrário, um atingimento de maturidade e de esplendor de ordem. Foi mais uma cristalização eclesial do que uma explosão carismática. Diríamos até que esse grande dia da Confirmação da Igreja vinha pôr termo à anarquia ou à dispersão informe dos primeiros tempos. Assinalemos que, em Pentecostes, com a evidência das línguas de fogo, a descida do Espírito Santo se fazia sobre a Hierarquia para bem marcar o caráter da Igreja Católica. E as "línguas" que também os Apóstolos nesse dia falaram, usando o dom das línguas que S. Paulo não reprova mas não estimula? Ora, esse ponto de semelhança é na verdade um ponto de oposição porque, enquanto os "pentecostistas" de hoje falam línguas que ninguém entende, nem eles mesmos, os Apóstolos falavam uma "língua que todos os vários estrangeiros presentes ouviram e entenderam como a própria". Torna-se evidente que o Espírito Santo, nesse dia, usou o mesmo dom para exprimir a "unidade de língua" da Igreja e a sua destinação universal. Formalmente, essa "unidade de língua" significa "unidade de doutrina", mas também pode significar a real unidade de língua que a Igreja teria quando recebesse seu o cunho Romano e portanto latino.

Vê-se assim que o "novo pentecostes" é dispersador quando o verdadeiro Pentecostes foi congraçador; que o moderno fenômeno é anarquista onde o autêntico é ordenador e hierárquico; que o moderno fenômeno se traduz em manifestações emotivas diversas e mais ou menos chocantes, enquanto o verdadeiro Pentecostes se arremata por um discurso de Pedro que imprime ao mistério pentecostal todo o seu sentido de unidade eclesial. É especialmente digno de nota o arremate do discurso de Pedro e do capítulo II dos "Atos".

Vale a pena comparar esses textos sagrados com a narração de Irling Shelton, uma das representantes de "L'Homme Nouveau" no congresso de Notre Dame:

"A oração perde seu ritualismo, seu formalismo, sua rotina. (Por que rotina?) Sem rejeitar completamente a oração ritual (...) a tônica é posta na espontaneidade (...) a expressão dessa efusão anterior pode então se acompanhar de movimentos da sensibilidade. Cantam, riem, choram, batem as mãos, prosternam-se no chão ou elevam os braços (...) Essas manifestações incontroladas da emotividade podem degenerar em atitudes grotescas e até em histeria de grupo. Mas quando o líder (?) controla bem seu grupo de orações, e sua emotividade, as manifestações sensíveis da efusão do Espírito poderão aquecer os corações e servir de edificação para todos".

Chamo a atenção do leitor católico alfabetizado na boa doutrina para a sem-cerimônia com que a autora dessas linhas atribui tais efusões ao Espírito, em vez de atribuí-las à Carne que costuma opor às obras do Espírito esse tipo de exteriorização. Na sadia espiritualidade traçada na Igreja pelos santos doutores aprendemos que os dons do Espírito Santo são recebidos por todos desde o seu batismo, e sabemos também que a espontaneidade sobrenatural é o chamado "modo dos dons" que opera nas almas longamente trabalhadas, arduamente purgadas. Há uma espontaneidade animal, sensível que precede a maturidade e a espiritualização. Qualquer criança a possui. Mas a espontaneidade dos dons é uma longa conquista que só os grandes santos atingem através da noite dos sentidos e da subida do Carmelo.

Estas poucas considerações tecidas no plano da teologia mística servem para mostrar que não há nada mais diverso e distante da verdadeira espontaneidade dos santos do que essa dos novos carismáticos.

Essas e outras notas do movimento chamado "Pentecostismo" mostram, a quem conheça os rudimentos da sagrada doutrina, que se trata de mais uma subversão contra a Igreja, disfarçada na falsa sublimidade de manifestações temerariamente atribuídas ao Espírito Santo. Explicam-se talvez pela extrema miséria a que chegou esta infortunada geração condenada às oscilações vertiginosas que vão da mais profunda depressão à mais delirante exaltação. Dá pena. Sim, dá-nos uma imensa tristeza esse quadro — mais esse! — de uma geração que se precipita na degradação dos mais altos dons naturais e sobrenaturais com uma espécie de irresponsabilidade, de subinocência que nos leva à vertiginosa indagação sobre a origem desse mal. Quem será então o culpado do rapto de crianças? Quem serão os culpados da perversão de toda essa geração dos que já não sabem de que espírito são? Deverei procurar entranhas de misericórdia para não ver culpas nos erros e nas quedas? Não seriam antes entranhas de indiferença que de bondade?

Ah! Se pudéssemos deixar os "pentecostistas" fazerem a grande antepenúltima asneira do século! Se pudéssemos apenas suspirar e lamentar o misterioso consentimento divino! O dia correria mais doce e o crepúsculo da vida teria a suavidade das tardes em que o Céu e a Terra parecem festejar o feliz amadurecimento de um dia do mundo. Mas que contas prestaria eu a Quem me pôs esta pena na mão e esse papel estendido sobre a mesa?

(Revista "Resistência", 15 de Janeiro de 1974. Visto em <permanencia.org.br>)

quarta-feira, 19 de abril de 2017

Pobres modernistas... #sqn

(Bunker Suburbano) | Tive hoje a oportunidade de assistir o filme “João XXIII - O Papa Bom”[1], eis o roteiro: uma Igreja velha e ditatorial; uma cúria ranzinza a perseguir injustamente os pobres modernistas arautos das novas ideias; um “Papa Bom”; um concílio revolucionário; e no fim, colocadas na boca de Ângelo Roncali uma mensagem irenico-ecumenico-novordista: <é preciso unir as religiões em prol da paz mundia>; faltou só a bandeirinha da ONU ondulando no final ao som de Imagine e teríamos um perfeito panfleto da Nova Ordem Mundial.

Se fosse mais bobo, não conhecesse história e, sobretudo jamais tivesse visto um modernista pessoalmente, poderia ingenuamente engolir essa historinha; quem sabe talvez se tivesse visto esse filme na minha adolescência lá com 14-15 anos; mas hoje não!

O pobre Nicola “injustamente” perseguido (ao menos é o que o filme diz) pode parecer simpático e inofensivo, mas os modernistas com quem convivi, apesar do sorriso igualmente simpático, destilavam seu veneno entre uma e outra risadinha, negando cada uma das verdades de Fé. Já ouvi negarem a ressurreição de Lázaro; já vi criarem um cânon dentro do cânon mutilando as Sagradas Escrituras para tentar encaixá-la em suas sandices; já vi negarem inclusive que Cristo fosse o cumprimento das profecias judaicas dizendo eles ser uma “forçasão de barra” dos evangelistas. Diante de tudo o que vi e ouvi da parte desses perversos hereges (o que não é nada comparado ao que clérigos como Dom Lefebrve devem ter presenciado) sou inclinado a pensar que a “perseguição” aos modernistas que é retratada no filme foi muito branda. Definitivamente os modernistas não são coitadinhos perseguidos injustamente pelo poder eclesial como propagandeia esta película! Os modernistas são apóstatas, teólogos da corte, empregadinhos dos donos do poder no mundo. Não são coitadinhos oprimidos, mas servos do poder, do poder mundano. Basta ver como a mídia maçônica e laicista ataca violentamente os guardiões da ortodoxia enquanto joga confetes em cada teólogo “moderninho”, como personagens como Leonardo Boff e Frei Beto estão sempre ás voltas nos círculos de poder, a serviço do PT, da ONU da Revolução. 

Vamos então redesenhar o cenário de acordo com a realidade: não temos os pobres modernistas oprimidos por uma Igreja ranzinza e autoritária; na verdade temos a Igreja de Cristo a incomodar o mundo, como o fez o seu mestre; e temos agentes do mundo infiltrados na Igreja, sucessores de Judas Iscariotes, a vender seu senhor aos donos do poder. 

Igualmente escrita sob medida pelos donos do poder esta a mensagem do final do filme: . Exatamente o que querem os globalistas; a criação de uma ONU das religiões, uma religião global, que dê o fundamento moral para um governo mundial.

E com tão escandalosa panfletagem, o total silêncio da crítica católica. Continuo eu, perplexo, a esperar o dia em que teremos no mundo da crítica cultural católicos verdadeiramente competentes. Até lá, resta este blogueiro provinciano a quebrar o galho.

Obs. Que fique claro que o alvo da crítica é o filme “João XXIII: O Papa Bom” e não a figura do Papa João XXIII, recentemente canonizado, cujo qual confesso que pouco conheço de sua biografia para ser capaz de dizer qualquer coisa a respeito. 

[1] João XXIII – O Papa Bom, disponível em <youtu.be/ruoVbd3Dsfg>

domingo, 19 de março de 2017

A Oração - Santa Faustina

"É pela oração que a alma se arma para toda espécie de combate. Em qualquer estado em que se encontre, a alma deve rezar. Tem que rezar a alma pura e bela, porque de outra forma perderia sua beleza; deve rezar a alma que está buscando essa pureza, porque de outra forma não a atingiria; deve rezar a alma pecadora, atolada em pecados, para que possa levantar-se. E não existe uma só alma que não tenha a obrigação de rezar, porque toda a graça provém da oração." (Diário, 146)

domingo, 12 de março de 2017

De Profundis (Salmo 129)


1. De profundis clamavi ad te Domine 
1. Do fundo do abismo, clamo a vós, Senhor!

2. Domine exaudi vocem meam fiant aures tuae intendentes in vocem deprecationis meae
2. Senhor, ouvi minha oração; que vossos ouvidos estejam atentos à voz de minha súplica.

3. Si iniquitates observabis Domine: Domine, quis sustinebit?
3. Se levardes em conta nossos pecados, Senhor, quem poderá permanecer diante de vós?

4. Quia apud te propitiatio est propter legem tuam sustinui te Domine sustinuit anima mea in verbum eius
4. Mas em vós se encontra o perdão dos pecados, para que, reverentes, o sirvamos. Ponho a minha esperança no Senhor. Minha alma tem confiança em sua palavra.

5. Speravit anima mea in Domino
5. Minha alma espera pelo Senhor.

6. A custodia matutina usque ad noctem speret Israel in Domino
6. Mais do que os vigias aguardam a manhã, Espere Israel pelo Senhor.

7. Quia apud Dominum misericordia et copiosa apud eum redemptio
7. Porque junto dele se acha a misericórdia; encontra-se nele copiosa redenção.

8. Et ipse redimet Israel ex omnibus iniquitatibus eius
8. Ele mesmo há de remir Israel de todas as suas iniquidades.

Dos exercícios piedosos que se aconselham ao cristão para cada dia

969) Que deve fazer um bom cristão, pela manhã, apenas acorda?
Um bom cristão, pela manhã, apenas acorda, deve fazer o sinal da Cruz, e oferecer o coração a Deus, dizendo estas ou outras palavras semelhantes: "Meu Deus, eu vos dou o meu coração e a minha alma".

970) Em que deveríamos pensar ao levantar da cama e enquanto nos vestimos?
Ao levantar da cama e enquanto nos vestimos, deveríamos pensar que Deus está presente, que aquele dia pode ser o último da nossa vida; e entretanto levantar-nos e vestir-nos com toda a modéstia possível.

971) Depois de se levantar e de se vestir, que deve fazer um bom cristão?
Um bom cristão, apenas se tenha levantado vestido, convém pôr-se na presença de Deus e ajoelhar, se pode, diante de alguma devota imagem, dizendo com devoção: "Eu Vos adoro, meu Deus, e Vos amo de todo o coração; dou-Vos graças por me terdes criado, feito cristão e conservado nesta noite; ofereço-Vos todas as minhas ações, e peço-Vos que neste dia me preserveis do pecado, e me livreis de todo o mal. Assim seja". Reza depois o Padre-Nosso, a Ave-Maria, o Credo, e os atos de Fé, de Esperança e de Caridade, acompanhando-os com um vivo afeto do coração.

972) Que práticas de piedade deveria fazer todos os dias o cristão?
O cristão, podendo, deveria todos os dias:
1º assistir com devoção à santa Missa;
2º fazer uma visita, por breve que fosse, ao Santíssimo Sacramento;
3º rezar o terço do santo Rosário.

973) Que se deve fazer antes do trabalho?
Antes do trabalho, convém oferecê-lo a Deus, dizendo do coração: "Senhor, eu Vos ofereço este trabalho, dai-me a vossa bênção".

974) Para que fim se deve trabalhar?
Deve-se trabalhar para glória de Deus e para fazer a sua vontade.

975) Que convém fazer antes da refeição?
Antes da refeição convém fazer o sinal da Cruz, estando de pé, e depois dizer com devoção: "Senhor, abençoai-nos a nós e ao alimento que vamos tomar, para nos conservarmos no vosso santo serviço".

976) Depois da refeição, que convém fazer?
Depois da refeição, convém fazer o sinal da Cruz, e dizer: "Senhor, eu Vos dou graças pelo alimento que me destes; fazei-me digno de participar da mesa celeste".

977) Quando nos vemos atormentados por alguma tentação, que devemos fazer?
Quando nos vemos atormentados por alguma tentação, devemos invocar com fé o Santíssimo Nome de Jesus ou de Maria, ou recitar fervorosamente alguma oração jaculatória, como, por exemplo: "Dai-me a graça, Senhor, que eu nunca Vos ofenda"; ou então fazer o sinal da Cruz, evitando porém que as outras pessoas, pelos sinais externos,suspeitem da tentação.

978) Quando uma pessoa reconhece ou duvida que cometeu algum pecado, que deve fazer?
Quando uma pessoa reconhece, ou duvida que cometeu algum pecado, convém fazer imediatamente um ato de contrição, e procurar confessar-se quanto antes.

979) Quando fora da Igreja se ouve o sinal de elevação da hóstia na Missa solene, ou da bênção do Santíssimo Sacramento, que se deve fazer? 
É bom fazer, ao menos com o coração, um ato de adoração, dizendo, por exemplo: "Graças e louvores se dêem a todo o momento ao Santíssimo e diviníssimo Sacramento".

980) Que se deve fazer quando tocam às Ave-Marias, pela manhã, ao meio-dia e à noite?
Ao toque das Ave-Marias, o bom cristão recita o Anjo do Senhor com três Ave-Marias.

981) A noite, antes de deitar, que devemos fazer?
À noite, antes de deitar, convém pôr-nos, como pela manhã, na presença de Deus, recitar devotamente as mesmas orações, fazer um breve exame de consciência, e pedir perdão a Deus dos pecados cometidos durante o dia.

982) Que haveis de fazer antes de adormecer?
Antes de adormecer, farei o sinal da Cruz, pensarei que posso morrer naquela noite, e oferecerei o coração a Deus, dizendo: "Meu Senhor e meu Deus, eu Vos dou todo o meu coração. Trindade Santíssima, concedei-me a graça de bem viver e de bem morrer. Jesus, Maria e José eu Vos encomendo a minha alma".

983) Além das orações da manhã e da noite, por que outra forma se pode recorrer a Deus no decurso do dia?
No decurso do dia pode-se invocar a Deus freqüentemente com outras orações breves, que se chamam jaculatórias.

984) Dizei algumas jaculatórias.
Senhor, valei-me; - Senhor, seja feita a vossa santíssima vontade; - Meu Jesus, eu quero ser todo vosso; - Meu Jesus, misericórdia; - Doce Coração de Jesus, que tanto nos amais, fazei que eu Vos ame cada vez mais; - Doce Coração de Maria sede minha salvação.

985) É útil recitar, durante o dia, muitas jaculatórias?
É muito útil recitar, durante o dia, muitas jaculatórias, e podem recitar-se também com o coração, sem proferir palavras, caminhando, trabalhando, etc.

986) Além das orações jaculatórias, em que outra coisa deveria exercitar-se com freqüência o cristão?
Além das orações jaculatórias, o cristão deveria exercitar-se na mortificação cristã.

987) Que quer dizer mortificar-se?
Mortificar-se quer dizer privar-se, por amor de Deus, daquilo que agrada, e aceitar o que desagrada aos sentidos ou ao amor próprio. 

988) Quando é o Santíssimo Sacramento levado a um enfermo, que se deve fazer?
Quando é o Santíssimo Sacramento levado a algum enfermo, devemos, sendo possível, acompanhá-Lo com modéstia e recolhimento; e, se não é possível acompanhá-Lo, fazer um ato de adoração em qualquer lugar que nos encontremos, e dizer: "Consolai, Senhor, este enfermo, e concedei-lhe a graça de se conformar com a vossa santíssima vontade. e de conseguir a sua salvação".

989) Ouvindo tocar o sino pela agonia de algum moribundo, que haveis de fazer?
Ouvindo tocar o sino pela agonia de algum moribundo, irei, se puder, à igreja orar por ele; e, não podendo, encomendarei a Nosso Senhor a sua alma, pensando que dentro em breve tempo hei de encontrar-me também eu naquele estado.

990) Ao ouvir sinais pela morte de alguém, que haveis de fazer?
Ao ouvir sinais pela morte de alguém, procurarei rezar um De profundis ou um Réquiem, ou um Padre-Nosso e uma Ave-Maria, pela alma daquele defunto, e renovarei o pensamento da morte.

Catecismo Maior de São Pio X; Capítulo VIII: Dos exercícios piedosos que se aconselham ao cristão para cada dia.

sábado, 25 de fevereiro de 2017

[Doc] O Mito da Inquisição Espanhola


Documentário da BBC de Londres sobre a Inquisição Espanhola. O vídeo traz depoimentos de pesquisadores isentos e renomados que se debruçaram sobre este complexo tema, desmitificando falsificações históricas arquitetadas com o único objetivo de criar uma lenda negra em torno desta complexa instituição e, destarte, desmerecer a Igreja Católica e sua contribuição decisiva na construção da civilização ocidental.

[Doc] The Soviet Story


The Soviet Story (A História Soviética) é um documentário lançado em 2008 sobre terror interno na União Soviética e as relações germano-soviéticas antes de 1941 escrito e dirigido por Edvins Snore e patrocinado pela grupo da União Européia das Nações no Parlamento Europeu. Snore passou 10 anos coletando informações e dois anos filmando em vários países.

O filme apresenta entrevistas com historiadores ocidentais e russos, como Norman Davies e Boris Sokolov, o escritor russo Viktor Suvorov, o dissidente soviético Vladimir Bukovsky, membros do Parlamento Europeu e os participantes, bem como as vítimas do terror Soviético.

sexta-feira, 17 de fevereiro de 2017

A Teoria da Evolução contra a ciência e a Fé (O conto do macaco) - Raul Leguizamon

Raul Leguizamon - Revista SEMPER

Introdução

Os dogmas de fé são muito difíceis – se não impossíveis – de refutar com argumentos científicos. A história da humanidade sobejamente o testemunha.

O nosso tempo não escapa, decerto, a esta regra, já que na atualidade, como em todas as épocas, uma boa quantidade de pessoas segue obstinadamente crendo coisas não só desprovidas de todo o fundamento científico, mas, além do mais, em franca contradição com o conhecimento científico que hoje possuímos.

Para dar um exemplo, entre centos, do atrás dito, referir-me-ei à insólita crença atual de muita gente – curiosamente, muitos deles cientistas – de que o homem descende do macaco. Sim, senhor! Assim, tal e qual.

Porque tem de saber-se que o tal pensado e manipulado "antecessor comum" do homem e do macaco, de que falam muitos cientistas e divulgadores. não é nem pode ser outra coisa senão um macaco. O suposto .”antecessor comum” seria certamente chamado macaco por alguém que o visse, afirmava o ilustre paleontólogo da Universidade de Harvard, George G. Simpson. É pusilânime, senão desonesto, dizer outra coisa, acrescentava Simpson. E desonesto, acrescento eu.

De maneira que todos os esforços dos antropólogos e investigadores deste tema, não se dirigem, de modo algum, a dilucidar, objetivamente e sem preconceitos, de que modo se originou o homem, mas de que macaco veio.

Por outras palavras: o postulado da nossa origem simiesca é uma convicção da qual se parte, e não uma conclusão a que se chega.

Ora bem, esta convicção, que muitos cientistas e divulgadores sustentam encarniçadamente (até ao ponto de mostrá-la ao mundo como um fato científico e demonstrado!), é – por definição – algo que está fora do campo da ciência experimental, que se baseia, precisamente na observação e reprodução experimental do fenômeno sob estudo. Coisas evidentemente impossíveis neste caso.

De maneira que, e com risco de não respeitar o significado das palavras, esta crença na origem do homem a partir do macaco é só uma hipótese de trabalho, uma suposição, uma conjectura, mais ou menos razoável, mais ou menos coerente, mais ou menos disparatada, mas sempre de caráter hipotético. Não só não demonstrada, mas, ainda mais – por definição – indemonstrável. E a ciência é demonstração.

O que a ciência pode legitimamente fazer a este respeito, é abordar o tema de forma indireta, isto é, examinar a suposta evidência científica que demonstraria a transformação do macaco em homem e, sobretudo, o mecanismo que se propõe para explicar essa transformação, para ver se dito mecanismo está em coerência ou em contradição com leis científicas bem estabelecidas; ou, ao menos, com a sensatez.

Por outras palavras, se bem que a ciência não possa dizer-nos como foi realmente a origem do homem – por tal ser metodologicamente impossível – pode dizer-nos, em troca, como não pôde ter sido essa origem.

Esclarecido este ponto, digamos que o que hoje vemos (base primeira do método cientifico), é que os homens originam-se de homens, e que os macacos engendram macacos. Por conseguinte, e em razão do princípio científico da uniformidade metodológica, segundo o qual o presente explica o passado, legítimo é supor que os homens sempre se originaram de homens e nunca de macacos. São os cientistas que sustentam o contrário (isto é, que alguma vez os macacos engendraram homens, ou se transformaram em tais) que tem o ônus da prova. Quer dizer, os que deviam carregá-los, se este tema fosse tratado com um mínimo de rigor e honestidade científica.

Como não é, resulta que, paradoxalmente, se aceita como dogma de fé (em nome da ciência – imagine-se!) que o homem descende do macaco; e a partir deste dogma interpretam-se e manipulam-se os dados científicos.

Mas, por que – tem de se perguntar – esta convicção tão categórica sobre a nossa origem? Quais são os fundamentos científicos de tamanha certeza? Bom, como disse atrás, fundamentos propriamente científicos não os há. A razão determinante e fundamental pela qual muitos autores crêem que o homem se originou a partir do macaco, é porque aceitam cegamente a hipótese evolucionista-darwinista que tal afirma. E ponto.

Não obstante, como numerosos cientistas, divulgadores, "charlatães cósmicos" da TV, revistas "muito interessantes", livros de texto e trovadores diversos nos saturam diariamente com as "evidências científicas" que "demonstram" a origem simiesca do homem, vale a pena analisarmos sucintamente estas supostas evidências "indubitáveis", segundo os mais fervorosos crentes na hipótese evolucionista-darwinista.

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2017

Um ‘Silêncio’ ensurdecedor - Pe. Gonçalo Portocarrero de Almada



Os sete pecados capitais do romance de Shusaku Endo e do filme de Martin Scorcese, segundo a doutrina e a moral católicas, pecados que decorrem de contradições com princípios básicos da fé cristã.

(Observador) |O filme ‘Silêncio’ tem certamente muitas qualidades cinematográficas, mas também tem, pelo menos, sete pecados capitais. Não os clássicos, mas os que decorrem das contradições entre o seu argumento e alguns princípios básicos da fé cristã e da moral católica.

O argumento do filme, inspirado no homónimo romance de Shusaku Endo, poder-se-ia resumir numa frase: por caridade, seria justificável a apostasia, ou seja, a rejeição da fé. Nalguns casos, o martírio, que é a vitória da fé, deveria ceder ante o imperativo da caridade: não seria virtuosa a morte que arrastasse consigo a vida de seres inocentes. Num contexto de uma eventual perseguição, poderia ser até meritória a apostasia, como expressão de um amor desinteressado, porque o mártir poderia ser, em última análise, um orgulhoso que, para garantir a sua própria glória, permitiria a tortura e morte de fiéis inocentes. Pelo contrário, o cristão autêntico seria o que, por amor aos outros – não é a caridade a principal virtude cristã?! – se disporia até a renegar a sua fé, mesmo sabendo que, desse modo, pecaria gravemente e, portanto, comprometeria a sua salvação.

Este é, grosso modo, o argumento de ‘Silêncio’, o romance de Shusaku Endo que Martin Scorcese realizou como filme. Mas, esta tese é aceitável segundo os ensinamentos da fé cristã e da moral católica? Não parece, à conta dos sete pecados capitais deste ensurdecedor ‘Silêncio’ …

1. O primeiro pecado capital de ‘Silêncio’ é, precisamente, a contradição que estabelece entre a fé e a caridade cristã, insinuando que, nalgum caso, pudesse ser necessário negar a fé para salvaguardar a caridade, ou seja, apostatar por amor. Uma tal suposição contraria a noção de martírio cristão, que não é, como se pretende fazer crer, um acto de orgulhosa afirmação pessoal, mas um acto supremo de caridade cristã: “ninguém tem maior amor do que quem dá a vida pelos seus amigos” (Jo 15, 13). São Paulo ensina que a morte mais cruel, sofrida pela fé, mas sem amor, não só não é martírio como não teria, em termos cristãos, nenhum valor: “ainda que eu (…) entregue o meu corpo para ser queimado, se não tiver amor, de nada me aproveita” (1Cor 13, 3). O mártir não antepõe a sua salvação e glória eterna ao bem dos outros mas, imitando Cristo, oferece a sua vida pelos seus irmãos e pelo bem das suas almas. Mesmo sendo, em termos humanos, inglória a morte do mártir, a Igreja sempre considerou que o martírio nunca é um acto egoísta, nem em vão, porque o sangue dos mártires é sementeira de novos cristãos.

Note-se que, antes de Cristo, o povo judeu já tinha esta convicção: a mãe dos sete irmãos macabeus exorta-os a permanecerem fiéis até à morte, pois seria desonrosa a sua apostasia, não só para eles, mas também para a sua família e para todo o povo de Deus. Quando as autoridades pedem à piedosa mãe que, pelo menos, evite a morte do último filho que lhe resta, aquela santa mãe que, “cheia de nobres sentimentos, juntava uma coragem varonil à ternura de mulher” (2Mac 7, 21), anima-o a permanecer fiel até à morte: “Não temas, portanto, este carrasco, mas sê digno dos teus irmãos e aceita a morte, para que, no dia da misericórdia, eu te encontre no meio deles” (2Mac 7, 29). A sua cedência seria sempre, mesmo naquele contexto tão doloroso, uma ignominiosa traição e, ao invés, a sua fidelidade até à morte, a melhor expressão da sua caridade, também para com os seus irmãos e a sua mãe, que por isso o anima a abraçar o martírio.

2. O segundo pecado capital de ‘Silêncio’ é a suposição de que um acto, em si mesmo mau, poderia não sê-lo num determinado contexto. Ou seja, mentir ou apostatar seriam justificáveis em legítima defesa, ante uma agressão injusta e brutal. É nesta contradição que radica o relativismo do argumento porque, segundo a moral cristã, uma acção intrinsecamente má não pode deixar de o ser, mesmo se for um meio para alcançar um bem maior. Não se pode matar um ser humano inocente, nem apostatar, mesmo que seja para salvar outras vidas.

3. O terceiro pecado capital radica na suposta independência entre os actos de um sujeito e a sua fé, ou seja, um crente poderia externamente apostatar, sem contudo negar a fé no seu interior. Mas não se pode restringir a afirmação da fé a uma mera atitude interior, porque é pelas obras que se conhece a verdadeira fé.

A cena final deste filme sugere, com efeito, que a apostasia poderia, na realidade, não ter afectado a verdadeira fé do apóstata, porque este, embora exteriormente tivesse publicamente repudiado a sua condição cristã, no seu íntimo continuaria a ser católico, mesmo vivendo em aberta contradição com a sua fé. Mas, seria cristã uma tal contradição entre as obras exteriores e as convicções íntimas?!

É óbvio que essa duplicidade, se consciente e voluntária, não é compatível com a fé cristã que, mais do que acreditar numas determinadas verdades, exige uma vivência de acordo com esses princípios, que o são precisamente porque têm correspondência com a prática. Portanto, não é católico quem diz que o é, mas quem procura viver como tal. Em caso de contradição entre a fé e as obras, é pelas obras que se há-de conhecer a fé e não o contrário: “de que aproveita, irmãos, que alguém diga que tem fé, se não tiver obras de fé? Acaso essa fé poderá salvá-lo? (…). Assim também a fé: se ela não tiver obras, está completamente morta. Mais ainda: poderá alguém alegar sensatamente: Tu tens a fé, e eu tenho as obras, mostra-me então a tua fé sem obras, que eu, pelas minhas obras, te mostrarei a minha fé. Tu crês que há um só Deus? Fazes bem. Também o crêem os demónios, mas enchem-se de terror. (…) Assim como o corpo sem alma está morto, assim também a fé sem obras está morta” (Tg 2, 14. 18-19. 26).

4. O quarto pecado capital tem que ver com o silêncio propriamente dito, que serve de título ao romance e ao filme correspondente. Na realidade, é quase blasfema a afirmação de que Deus se mantém silencioso quando os padres Ferreira e Rodrigues se enfrentam com um doloroso dilema, porque eles sabem muito bem qual a resposta de Deus a essa sua dúvida. Com efeito, Deus fala pela Sagrada Escritura, Deus fala pela sagrada tradição, Deus fala pelo magistério da sua Igreja, Deus fala pela oração, Deus fala pela obediência do religioso ao seu superior, Deus fala ainda pela voz da recta consciência. Mais do que silêncio de Deus, haveria que falar da surdez dos homens que não querem ouvir a sua voz, ou da sua fraqueza para cumprirem os seus mandatos.

Imputar, a um hipotético silêncio divino, a culpa pela apostasia do missionário é tão absurdo como seria despropositado que um assassino se desculpasse do crime que realizou, dizendo que não ouviu nenhuma voz do alto proibindo-o de matar …

5. O quinto pecado capital de ‘Silêncio’ é a sua tentativa de apresentar a religião católica como um produto ocidental que se opõe à tradição e cultura nipónica, como se os missionários, com o pretexto de evangelizar, no fundo fossem colonizadores, ou agentes de um certo imperialismo cultural. Neste sentido, a reacção das autoridades japonesas seria, em primeiro lugar, patriótica e, neste sentido, pelo menos compreensível, se não mesmo louvável.

Ora o Cristianismo não pertence, em regime de exclusividade, a nenhuma cultura ou tradição mas, como verdade que é, faz parte do património universal da humanidade. Seria absurdo considerar que a evangelização da Europa foi, na realidade, uma acção colonialista oriental, só porque os cultos pagãos europeus foram substituídos pela crença judaico-cristã, de origem asiática. Toda a verdade, nomeadamente a fé cristã, não é de nenhum povo em particular mas, como a ciência, é património de toda a humanidade: é por isso que a Igreja é católica, ou seja, universal.

Em cada país, a fé cristã adapta-se perfeitamente aos usos e costumes locais, desde que sejam moralmente lícitos. Diga-se de passagem que nesse processo, nem sempre fácil, de inculturação da fé, os jesuítas realizaram um trabalho admirável, nomeadamente no Extremo Oriente.

6. O sexto pecado capital de ‘Silêncio’ é o que decorre da metodologia adoptada para o tratamento cinematográfico, mesmo que ficcionado, de uma determinada realidade histórica. Com efeito, a dificílima evangelização do Japão é uma das páginas mais heroicas da história da Igreja Católica e da Companhia de Jesus: ao referi-la pela perspectiva da apostasia de uns poucos, ofende-se a memória dos muitos que foram verdadeiros heróis. A apostasia de alguns foi a excepção à regra do martírio de tantos: recordem-se, por exemplo, São Paulo Miki e os seus companheiros mártires.

É verdade que o Padre Cristóvão Ferreira apostatou e não foi o único, mas contar a evangelização do Japão por esse prisma é tão incongruente como seria injusto expor a acção heroica dos 40 conjurados que restauraram a independência nacional, em 1640, pelo prisma do traidor Miguel de Vasconcelos …

7. O sétimo pecado capital de ‘Silêncio’ é confundir apostasia com apóstatas, transferindo o perdão e compreensão de que os apóstatas, como quaisquer outros pecadores, carecem, para a própria apostasia, que é deste jeito moralmente justificada. Ora a Igreja sempre ensinou a amar os pecadores e a detestar o pecado, de modo semelhante a como o médico luta contra a doença, mas acolhe e protege os doentes. A tolerância é para o pecador, não para o pecado e, mesmo aquele, só pode ser perdoado e acolhido de novo se verdadeiramente arrependido.

A Igreja sempre venerou os mártires, mas nunca os confundiu com os apóstatas, que também nunca excluiu, muito embora requeresse, para o seu perdão e readmissão na comunhão eclesial, o seu arrependimento e penitência, que devia ser pública quando a apostasia também o era. Assim aconteceu com os primeiros cristãos que fraquejaram ante as perseguições romanas, os lapsi, sobre os quais S. Cipriano de Cartago escreveu um tratado.

Ao contrário dos muçulmanos, que ainda hoje aplicam a pena capital aos renegados, a Igreja Católica, sem nunca legitimar a apostasia, sempre perdoou e acolheu de novo os apóstatas arrependidos. Simão Pedro negou por três vezes o Mestre, chorou amargamente o seu pecado, de que o Senhor o perdoou e depois foi mártir e o primeiro papa da Igreja Católica! Porque Deus é amor, perdoa sempre o pecador arrependido, não uma vez, nem três ou sete, mas, como em ‘Silêncio’ se mostra de forma tão comovente, setenta vezes sete! (cf. Mt 18, 22).

O Heresiarca Lutero

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